Engoli meu discurso ideológico e fui pra Boa Viagem
presenciar o que falam por lá. De imediato senti um arrepio na alma por estar
lutando contra mim. Eu não ia ser eu por algumas horas. Olhei ao redor e
enquanto questionava as pessoas sobre suas posições políticas, minha atenção
desviou quase que apressadamente para uma placa pendurada em uma mulher que
dizia: MST, o câncer do Brasil. Meu eu quase anestesiado e adormecido começou a
se rasgar procurando uma saída para viver. Eu estava sufocada em mim. Ainda
incrédula pelo discurso de ódio estampado nas caras inertes ali, meus olhos
marejados viam outra palavra colada em roupas pretas: REACIONÁRIOS. Eram
Skinheads, atordoada, pensei. E o tempo parou, assim, diante de mim, diante das
quatro horas em pé, diante do meu eu fingido. Houve um minuto de silêncio em
mim e eu desabei no chão sem chão. Desabei no sangue escondido na terra.
Desabei nas lágrimas de outras auroras que ali percorreram olhando pro pé com
medo do que via em cima. Desabei em corpos negros pedindo clemência pra ser
livre. Desabei no preconceito da igualdade que procurava reféns. Desabei. No
sentido literal. Literário. Libertário. Eu não ia ser eu por algumas horas. Mas eu fui.
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A representatividade dos momentos e acontecimentos é engraçada. O caso de Rafael Braga, por exemplo, aparece como individual, quando na verdade carrega consigo milhões de outras pessoas. É apavorante perceber o quanto as pessoas veem tanta normalidade nessa destilação de ódio. Por esses dias uma professora comentou que uma "amiga" no facebook havia compartilhado algo como "o povo do MST merece terras sim, mas a sete palmos do chão". A gente nem chega a questionar o quanto isso é problemático e cruel, sim. Enquanto isso vamos lendo orgulhos "de ser opressor" e tentando, ao máximo, não se sentir confortável, porque não seríamos nós. E essa tentativa de não sermos nós só acaba nos afirmando ainda mais. Bem contraditório. Bom ter lido teu texto aqui hoje. Um beijo.
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